2006-12-29

Reguladores

Face a alguma polémica levantada pela demissão do presidente da ERSE (que propunha, recordemos, um aumento do preço da electricidade doméstica obviamente inaceitável por este ou por qualquer outro governo) o PSD sugeriu, esta quinta-feira, que seja criado um novo modelo de nomeação dos conselhos de administração das entidades reguladoras, onde a última palavra deve ser sempre do Presidente da República.
De acordo com o modelo proposto, «o Governo faria a proposta das pessoas a designar», que posteriormente «seriam ouvidas na Assembleia da República», através de uma comissão especializada, explicou à TSF Luís Pais Antunes.«Tendo em conta o resultado da audição, o Presidente da República tomaria a decisão», como acontece actualmente na nomeação do Governador do Banco de Portugal, acrescentou o vice-presidente do PSD.
Os sociais-democratas pretendem que esta medida sirva para evitar «manipulações politicas» na nomeação destes cargos e desenvolver um caminho mais democrático e respeitador do equilíbrio de poderes.

Há nesta notícia amplo espaço para reflecções consequentes:
a) porque é que chegamos a esta situação, em que o aumento economicamente “correcto” ultrapassaria os 16%?
b) Quem é que se esqueceu de aumentar quando devia?
c) Como é que se explica a necessidade de um aumento superior a 16% quando as empresas do sector continuam a dar lucros substanciais?
d) Porque é que em anos anteriores o Eng.º Vasconcelos nunca sentiu a necessidade de propor tais aumentos ou de se demitir?

Há nesta notícia espaço para interrogações pertinentes, sobre o vazio ideológico que submerge o PSD:
a) o evitar “manipulações políticas” leva-nos a um “caminho mais democrático”?
b) o envolver o Presidente da República na política de preços administrativamente fixados é da natureza da social-democracia? Mais;
c) Tal caminho é coerente com o sistema constitucional de separação de poderes?
d) Não seria mais lógico que as entidades reguladoras fossem nomeadas pela AR?

Estas coisas preocupam-me porque, não fazendo eu a mínima intenção de votar PSD nos tempos mais próximos, não descarto, por uma simples questão de bom-senso, a hipótese de um dia destes (um ano destes, melhor dizendo) ter de, democraticamente, ser governado por um governo PSD.

Nessa altura convinha-me que fosse um PSD responsável.
Que do outro já tive a minha dose.

2006-12-28

Sem título (por pudor)

Broche era, no meu tempo, um adorno que as senhoras usavam ao peito. Segundo o Dicionário Prático Ilustrado ( que não tem, aliás, nenhuma ilustração da coisa), trata-se de um fecho de metal ou jóia munida de um grosso alfinete. Ou, segundo o Dicionário da Língua Portuguesa, 8ª Edição, da Porto Editora, 1986,de um adereço em forma de fecho com que as mulheres prendem qualquer peça de vestuário junto ao pescoço.

Entretanto, as modas passaram e as mulheres deixaram-se dos broches.

Ao mesmo tempo o sentido da palavra metamorfoseou-se e hoje não pode ser pronunciada, salvo num grupo de machos, em contexto de anedota porca e em ambiente ligeiramente alcoolizado.

Vem isto a propósito de que, tendo eu passado o Natal num local que além de outras maravilhas tem essa de que quem quer o jornal tem de o ir buscar a mais de oito quilómetros de distância, regressado à cidade e ao hábito de começar o dia comprando o PÚBLICO (o hábito, quando desprovido de razão, chama-se vício) deparo com a preciosa notícia – ilustrada com fotografia do personagem – de que Mónica Lewinsky acabou de se pós-graduar em Psicologia em Londres. A notícia esclarecia que a senhora ficou famosa por ter mantido um caso com o ex-presidente americano Bill Clinton.

Obrigado José Manuel Fernandes!

Que seria de mim na ignorância de tal facto?

São estas e outras que fazem do PÚBLICO um grande jornal. São estas e outras que me fazem pensar porque é continuo a gastar dinheiro convosco.

Ah!, deixe-me acrescentar: V.Ex.a está a esmerar-se. Hoje a última página do PÚBLICO é dedicada, por inteiro, ao sexo à americana.

Muito obrigado.

O "passeio" dos militares, as consequências disciplinares e os posts reaccionários

Não sou militar.
Cumpri o serviço militar, entre 1969 e 1972, os dois últimos anos passados na Guiné.
Dói-me ver o nível da discussão em que os militares se deixaram envolver.
Dói-me o arrazoado estúpido que leva alguns a dizer que este Governo éilegítimo.
A Instituição Militar portuguesa não tem, no Século XX, uma História de que se possa orgulhar por aí além. Também não é grave. As instituições existem para além das pessoas mas apenas dentro de certos limites.
E a verdade é que os militares, a par dos juízes, dos padres e de mais uns quantos foram, durante décadas, os mais fiéis esteios do Salazarismo.
A brigada do reumático. Lembram-se?
Em matéria de liberdade estamos conversados.
Têm os militares algumas razões de queixa como eu, funcionário público, as tenho.
Mas esperava deles mais aprumo.
O "passeio" envergonha os militares.
A maioria dos posts que estão no blog http://soumilitar.blogs.sapo.pt/ associado à notícia de hoje, esses não envergonham os militares. Só os autores.

2006-12-20

Burocracias

Há largos anos estive profundamente envolvido na realização de um concurso de admissão de pessoal para a função pública com mais de 40.000 candidatos, o maior concurso de provimento realizado até àquela data.
Sendo os lugares disponíveis muito menos que os candidatos e estando fresca a publicação do Código do Procedimento Administrativo, as reclamações e os recursos foram, naturalmente, mais que muitos. Controladas essas reclamações e recursos, em termos que, agora, não interessa explanar mas a imprensa da época reflecte, o concurso lá foi andando até ao fim e ao Visto do Tribunal de Contas.
Não contente com a documentação que lhe havia sido enviada, o Tribunal de Contas oficiou a solicitar o envio de “todo o processo do concurso”. Foi-lhe respondido que o processo ocupava mais de quatrocentas pastas de arquivo pelo que, face a tal volume e à necessidade de alugar uma camioneta para fazer o transporte, se solicitava fosse indicada a data, hora e local onde a entrega poderia ser feita.
Até hoje, que eu saiba, tal ofício nunca teve resposta.
Estava esta história quase esquecida quando dou, neste ano de graça de 2006, pelo pedido do mesmo Tribunal de Contas para que lhe seja enviada, no âmbito de um processo de Visto, fotocópia autenticada de um processo de concurso de pessoal que ocupa mais de 120 pastas de arquivo, seja, números redondos, seguramente mais de 50.000 folhas, de tamanhos diversos (pelo menos A3 e A4), muitas com frente e verso, em papeis de diversas gramagens e texturas.
Tais fotocópias hão-de, naturalmente, ser, em todas as páginas escritas, carimbadas com a certificação de conformidade com o original, devidamente assinada e autenticada com selo branco e, furadas e metidas em outras tantas cento e vinte e tal pastas de arquivo.
Há-de, a seu tempo, ser resolvido o como, quando e onde serão entregues.
Admitindo que uma máquina fotocopiadora de razoável rendimento consegue, no caso, uma produtividade média de 20 cópias por minuto, teremos como tempo de trabalho de máquina de cerca de 7 dias úteis,
De papel, serão cerca de € 260,00.
De pastas de arquivo, cerca de €210,00.
O tempo e os respectivos custos, dos funcionários que hão-de (50.000 vezes) fotocopiar, carimbar, assinar, selar, furar,arquivar e transportar tal massa de papel, mais o custo do toner de impressora e da viatura de transporte, serão calculados por quem tiver mais tempo e paciência que eu próprio.

Havia necessidade?

2006-12-12

Corrupções

Um novo parecer junto ao processo Apito Dourado defende que um certo fulano, não pode ser acusado de crimes de corrupção passiva porque o cargo que ocupava não é equiparável ao de funcionário público, requisito fundamental daquele ilícito.
Agora se percebe a fúria anti-corrupção de alguns palradores.
Não os atinge.
Todas as tramóias são possíveis porque, não sendo funcionários públicos, por definição não são corruptos.
Interessa pouco ao caso que as suas trampolinices afectem a vida pública com uma intensidade absolutamente fora do alcance da maioria dos funcionários.
Interessa pouco que vivam, todos eles, de um modo ou outro, à conta do orçamento.
Não tomaram posse e isso basta para continuarem livres como pássaros.
Seria risível se não fosse triste.
Mas, na verdade, sempre foi assim.
As leis penais sempre andaram um passo atrás dos criminosos.

2006-12-07

TLEBS

A terminologia linguística para os ensinos básico e secundário é o tema da polémica em curso.
Cheira-me, à luz da experiência, que também esta é uma polémica inútil. Seja, vai ficar tudo na mesma como se não tivesse existido qualquer polémica. Mas é, apenas um feeling (feeling? esta não está, espero, na TLEBS) fruto, talvez, do meu reconhecido mau feitio.
Seja como for, não quero entrar na polémica. No meu tempo havia orações que foram, naquela época, capazes de matar qualquer hipótese de amor da generalidade dos estudantes pela literatura portuguesa. Sem conhecer (o que conheço – dos jornais – é suficiente para me convencar que se trata de coisa com que não quero lidar), aposto que a TLEBS não conseguirá fazer pior.
O problema não é a TLEBS. O problema é um sistema de ensino que ninguém – a não ser alguns dos que dele vivem – compreende ou respeita.
Veja-se o exemplo de uma amiga, mãe de uma criança de dez anos a frequentar o quinto ano de escolaridade:
Ontem a criança apareceu espavorida em casa, dizendo que a professora exigia que hoje chegasse à escola com um livro de receitas tirado da internet.
Parece que o exercício tinha por objectivo exercitar as competências de pesquisa online, transferência e impressão de ficheiros, incluindo fotografias, formatação de textos, com negritos, sublinhados e mais não sei o quê.
Resultado, para aplacar o stress em que a filha notoriamente vive , chegada a casa tarde e más horas (é verdade, há funcionários públicos que trabalham, sem remuneração, muitas horas extraordinárias) a minha amiga decidiu ajudar e, passada a meia-noite, lá estava o livro de receitas tirado da internet concluído.
Levantar cedo, preparar a filha para apanhar a carrinha do colégio (sim, Sr. Prof. Mário Pinto. Trata-se de um colégio privado), até que, na hora do beijo à porta, a criança dispara: Mãe! Não temos bebidas!
Enquanto a filha descia com o pai, a minha amiga fez mais uma correria para o computador, pesquisou, encontrou e imprimiu uma sangria e desceu, sempre a correr, ainda em pijama e meias, até à carrinha que já esperava.
Pergunta simples de um ignorante destas coisas: Não bastaria pedir-se uma receita a cada aluno e juntar tudo, devidamente corrigido na sala de aula, para formar um livro de receitas da turma?

2006-11-14

Greves e Verdades

Nos últimos episódios (até à data), de um ping-pong que começou na manhã do dia da greve, o Diário de Notícias publicou ontem uma notícia segundo a qual, muitos trabalhadores optaram por meter baixa no dia de greve, facto que justificará, em parte as divergências entre Governo e Sindicatos na contagem dos grevistas.
A CGTP reagiu com acusações ao Governo de manipulação da informação.
Ora, esta questão de saber qual a efectiva adesão a uma greve é matéria que não pode deixar de interessar a todos. Ao Governo, porque lhe convém ter um indicador fiável do descontentamento. Aos sindicatos porque, igualmente, lhes convém possuir um indicador fiável da adequação das suas políticas aos interesses dos seus associados.
Estou a ser ingénuo? Parece que sim, uma vez que todos, Sindicatos e Governo, parecem, antes, apostados em esconder a realidade.
Mas, ainda que assim seja e, sobretudo, se assim for, eu, cidadão, tenho o direito de conhecer a verdade.
E, quando os números do Estado se ficam por pouco mais de 10% e os dos Sindicatos apontam para os 80% de adesão, então alguém está a mentir (ou ambos) e, eu, cidadão, tenho o direito de que não me mintam.
Acabem, por isso, com estas picardias.
A greve é um direito e tem uma consequência: o não pagamento do vencimento correspondente.
Nada mais simples, portanto: veja-se, no fim do mês, quantos funcionários sofreram desconto de vencimento no dia da greve. Esse é o número máximo, possível de aderentes à greve.
Deixem-se de picardias e falem-nos verdade.

2006-11-07

O BE aderiu ao corporativismo

Segundo os jornais de hoje:

O líder do Bloco de Esquerda (BE), Francisco Louçã, propôs, ontem, um sistema de avaliação para os professores dos ensinos Básico e Secundário semelhante ao dos docentes universitários, em alternativa ao processo de quotas defendido pelo Ministério da Educação (ME). "No Ensino Superior temos um modelo de avaliação em que um conjunto de professores da escola e de fora da escola, escolhidos pelas suas capacidades reconhecidas, fazem uma avaliação inter-pares da capacidade pedagógica e da capacidade científica e do trabalho que as pessoas deram à escola", defendeu Francisco Louçã. O líder do BE falava aos jornalistas após visitar uma escola básica de Lisboa. Louçã defendeu que o "modelo de rigor" em que são avaliados os professores do Ensino Superior "deve ser aplicado também nos outros níveis de ensino". Francisco Louçã insurgiu-se contra o sistema de avaliação dos professores proposto pelo ME, que considera ser "um sistema fechado que impede que as pessoas exerçam uma profissão de acordo com as suas capacidades". Segundo Francisco Louçã, "a quota serve para excluir, não para avaliar".

O Dr. Louçã tem, em parelha com o Dr. Mendes e o Gato Fedorento, um problema nem sempre facilmente ultrapassável: Tem horas para falar e tem de dizer coisas originais para agradar a plateias exigentes. Mas isso não justifica tudo.

Quando o triste (tristemente inexistente) papel da Universidade na História de Portugal, deveria levar qualquer alma minimamente séria a concluir que o modelo de avaliação universitária (que todos sabemos se tem caracterizado por tudo menos pelo rigor) deveria ser mudado e não reproduzido, é triste ver esse farol da “esquerda” que o BE arrogantemente se julga, cooptado pelo mais retrogrado corporativismo.

Avaliação pelos pares? Tenha dó Sr. Dr.

Foi a avaliação pelos pares que nos colocou onde estamos!

2006-11-02

Inutilidades

O PÚBLICO tem por hábito colocar a “referendo” dos seus leitores algumas questões bizantinas, a última das quais era: “Concordaria com uma eventual união entre Portugal e Espanha?”.
Dos que acharam útil perder tempo e dinheiro a responder, 43% respondeu que sim.
Que devemos concluir? Que 43% dos portugueses concordam com a união entre Portugal e Espanha?
Não me parece. O melhor é concluir apenas que os 43% dos televotantes da questão, ou melhor, 43% dos televotos expressos, disseram sim.
E, mais, concluir que aqueles votos representam uma idéia errada.
Quando Catalães e Bascos, Galegos e, até Valencianos e Estremenhos querem desunir-se de “Espanha” porque haveríamos nós de nos querer unir?

2006-02-03

Casamentos

A conversa do dia (em disputa cerrada com o euromilhões, diga-se) é a questão do casamento homossexual.
Ora, o casamento não é nem o que os que são contra pretendem nem, muito menos, o que julgam os homossexuais candidatos. Quanto a estes, convicto que estou de que alguma coisa os legisladores hão-de inventar para os calar, é certo que não faltará muito para ver-mos legisladas as relações entre pessoas do mesmo sexo. Quanto aos do contra, sabida a extraordinária capacidade de adaptação do povo português, não tardará muito para que aceitem os factos, como aceitaram o voto feminino e muitas outras coisas que pouco tempo antes abominavam.
O que eu não entendo é o entusiasmo dos homossexuais.
Querem casar-se para quê, quando os heterossexuais se casam cada vez menos e já conseguiram o reconhecimento legal da união de facto?
Será que os homossexuais querem ter direito ao casamento para “selar” socialmente o seu amor? Se assim é então isso só prova que nada sabem de História, no que aliás estão muito bem acompanhados pelos mais ferozes oponentes, desde logo os que trazem à colação a religião.
António Alçada Baptista escreveu, há anos atrás, que o casamento morreu no Século XIII, quando nele se intrometeu o amor (cito de cor um texto, se bem me lembro, publicado na revista Máxima).
De facto, o casamento não é uma benção religiosa nem um mero contrato civil (só o é há duzentos anos) nem, muito menos, um pacto de amor (é-o desde o Século XIII, mais nos romances de cavalaria do que na vida e voltou a sê-lo, a partir do Século XIX, por acção das idéias românticas).
Historicamente o casamento é, sobretudo, um pacto de gestão de patrimónios.
Como os homossexuais vão, em breve, descobrir.
Ou, como dizia o meu saudoso patrono: Ah! Vocês dão-se bem? Então façam partilhas!

2006-01-24

Manuel Alegre e o PS

Durante algum tempo vamos ouvir muita discussão a propósito de Manuel Alegre e o PS. Do inquérito no Sapo que quer saber se o Manuel Alegre é um problema para o PS, até à previsão catastrófica da Maria José Nogueira Pinto que já decidiu que, em consequência dos resultados eleitorais, o PS vai implodir, veremos e ouviremos de tudo. O que mais ouviremos, não tenho dúvidas, serão verbalizações de desejos sem qualquer aderência à realidade como o passado já demonstrou em situações semelhantes e o futuro se encarregará de confirmar.
É claro que essa particularidade lusitana de todos os comentadores – toda a gente não jornalista com acesso aos jornais e às televisões – ser ou ter sido dirigente político, será um forte condicionante do futuro.
O caso da MJNP dirigente político de um partido adversário do PS e apoiante da candidatura do Presidente eleito, é paradigmático. O que ela faz não é, nem poderia ser, comentário político informado e independente. O que ela faz é o que convém ao seu partido. Partido esse – o outro partido - que apoiou Cavaco Silva que, para não perder de vista o cavalo do poder, se fez de morto durante toda a campanha eleitoral.
Ora, a verdade é que, apesar disso, há um país que pensa, um país que se move, a maioria dele perfeitamente indiferente a todos os comentadores. É esse país que decidirá se o Manuel Alegre vai ser um problema para o PS ou, mais importante, se o futuro político da Nação vai, de algum modo, ser condicionado por Manuel Alegre e, sobretudo, por aqueles dos seus apoiantes que estão danadinhos por dar expressão formal ao movimento de cidadãos que apoiou a candidatura.
Sobre isto apetece-me dar-vos conta de uma conversa com a minha filha, alguns dias antes das eleições:
Perguntava-me ela: Mas se o PS tivesse apoiado o Manuel Alegre tu votavas nele. Ou não? Claro que votava e votava porque se o Manuel Alegre tivesse sido o candidato apoiado pelo PS a sua campanha e o seu discurso não teria sido o que foi. Não teria sido o que foi desde logo porque o pessoal da sua candidatura não seria o que foi. Manuel Alegre não teria sobre o PS o poder que Cavaco Silva teve sobre o PSD e o CDS, seja, Manuel Alegre nunca poderia ter dito ao PS finjam-se de mortos, não vos quero cá, quem manda aqui sou eu.
Uma candidatura de Manuel Alegre apoiada pelo PS não teria contra si uma candidatura de Mário Soares e isso implicaria um empenhamento do aparelho do Partido que – por falta de alternativa - seria muito maior do que aquele que existiu de apoio a Mário Soares.
Do que resultaria necessariamente que o discurso de Manuel Alegre teria sido muito diferente do que foi e, provavelmente, não ouviríamos dele (como ninguém se lembra de ter ouvido em trinta anos) uma única palavra contra os partidos. (E não se esqueça que todas as arengas de Manuel Alegre contra os partidos foram entendidas por toda a gente como arengas contra o PS).
E daqui resultariam outras coisas interessantes como a de Manuel Alegre não colher, neste cenário, os votos dos descontentes antipartido que são em número avultado e em crescimento. Provavelmente teríamos tido, neste cenário, uma votação no BE muito maior do que aquela que se veio a verificar.
Resumindo: É minha convicção profunda que (diferentemente do caso de Jerónimo de Sousa que foi às eleições para contar os votos e, efectivamente, eles responderam à chamada) uma parte substancial dos votos em Manuel Alegre não pertencem a Manuel Alegre.
O Manuel Alegre não vai ser um problema para o PS. Assim ele o compreenda.
Se não, será talvez uma comichão, algumas borbulhas, talvez uma febre carente, mesmo, de alguma medicação. Mas não mais do que isso. Passará, com mais ou menos incómodo, mas passará.
Assim Manuel Alegre o compreenda.

2006-01-20

Votar Mário soares

Com a devida vénia e sem pedido de autorização transcrevo um belíssimo e comovente texto que está no
http://mautemponocanil.blogspot.com/
E é assinado pelo jornalista Francisco Trigo de Abreu:

"Votar para mim é uma cerimónia espiritual. E gosto de votar logo pela manhã. Se for o primeiro da secção de voto, melhor ainda. Também tive o privilégio de durante anos ajudar a minha avó a votar. Ia buscá-la ao lar. Comigo levava um boletim de voto feito em casa com todos os partidos que concorriam às eleições. Tirava todas as informações do site da CNE. Depois ela fazia a cruz e eu ficava a saber em quem ela queria votar.Depois (muitas pessoas desconhecem que os mais incapacitados fisicamente podem votar), levava-a ao centro de saúde de serviço, onde uma médica a entrevistava para aferir se ela tinha capacidade de voto. Ela, a médica, perguntava sempre à minha avó (que mal andava e ouvia muito mal) porque é que ela queria votar. A minha avó respondia sempre da mesma maneira: "Porque é importante votar".E depois vinham outras perguntas. Como é que se chama? "Isabella". Sabe ler? "Leio o Público e o DN todos os dias". Quantos filhos tem? Uma vez disse o nome dos filhos todos (sem se esquecer dos dois que morreram à nascença) e dos muitos netos. Também já se preparava para dizer que netos é que correspondiam a cada filho e até o nome das noras.A médica passava o atestado e lá nos encaminhávamos para a mesa de voto. Ela entregava o atestado e davam~lhe o boletim. Ela chegava-se ao local do voto muito agarrada a mim e eu passava-lhe uma lupa (atenção que os símbolos são muito pequenos). Ela via e lá fazia a sua cruz. Eu verificava se tinha votado em quem queria (com base no voto feito em casa) e depois íamos depositar o voto na urna. Este ritual durava, muitas vezes, mais de duas horas.Desde que tenho 18 anos (agora tenho 32), que sempre fui levar a minha avó a votar. Este ano já não posso. A minha avó votou pela última vez aos 90 anos. As minhas eleições vão ser mais pobres. Não se esqueçam. "É importante votar".

Obrigado FTA.

E se alguém ler fica a saber que também eu vou votar mário Soares.
Porquê?
Muitas razões algumas delas também explicadas pelo FTA no mesmo blog.
Nem sequer me preocupa o facto de ele ser velho. Se morrer em funções não há problema. elegeremos outro.
Apenas os povos que elegeram salvadores tiveram esses problemas. Enquanto e salvador estava vivo e quando o salvador morreu.

2006-01-09

Metáforas futebolísticas

Mário Soares,
o árbitro (como compete ao PR: “Acima de tudo, [o PR] é o moderador e o árbitro do sistema. ”).
Cavaco Silva,
o treinador (que quer mandar na equipa governamental, como o próprio argumentou: “Às vezes, a equipa não é má, mas precisa de um novo treinador. ”).

Manuel Alegre,
o presidente do clube (adepto das chicotadas psicológicas, como já o anunciou publicamente, a propósito da dissolução da AR: “os poderes presidenciais são para exercer .”).

Jerónimo de Sousa,
o jogador (integrado no colectivo, pois quem manda é o Partido: “Não sou […] decisor. O meu partido tem regras e estatutos. ”).

Francisco Louça,
o suplente (aproveita a oportunidade para tentar ser chamado à equipa principal: “As pessoas sabem o que está em disputa e sabem que o crescimento da votação na minha candidatura é a expressão de uma alternativa. ”).

(com a devida vénia a OCanhoto e os cumprimentos de muita simpatia pessoal ao Garcia Pereira que aqui só caberia como espectador)