2009-10-14

A mãe do António Costa

Diz o António Costa numa entrevista ao DN: “A minha mãe está sempre em protesto. Há quarenta e oito anos que é assim, só varia o tema.”


O meu amigo é assim. Parece a mãe do António Costa. Está, há mais de trinta anos, (desde que o conheço), em protesto. Só varia o tema.

Agora na merecida reforma, ocupa os dias a enviar, a uma alargada lista de contactos, carradas de emails a protestar.

Só nos últimos dias, protestou contra o TGV, o NAL, a reforma do Padre Milícias, os vencimentos dos pivots da RTP e a Maitê Proença.

O meu amigo é um homem bom (condição que exijo de todos os meus amigos) mas tem o coração ao pé da boca.
 
O meu amigo faz-me, irresistivelmente, lembrar os Deolinda, de que também gosto muito, especialmente a canção Movimento Perpétuo Associativo que parece ter sido escrita a pensar nele:

 
Agora sim, damos a volta a isto!
Agora sim, há pernas para andar!
Agora sim, eu sinto o optimismo!
Vamos em frente, ninguém nos vai parar!

-Agora não, que é hora do almoço...
-Agora não, que é hora do jantar...
-Agora não, que eu acho que não posso...
-Amanhã vou trabalhar...

Agora sim, temos a força toda!
Agora sim, há fé neste querer!
Agora sim, só vejo gente boa!
Vamos em frente e havemos de vencer!

-Agora não, que me dói a barriga...
-Agora não, dizem que vai chover...
-Agora não, que joga o Benfica...
e eu tenho mais que fazer...

Agora sim, cantamos com vontade!
Agora sim, eu sinto a união!
Agora sim, já ouço a liberdade!
Vamos em frente, e é esta a direcção!

-Agora não, que falta um impresso...
-Agora não, que o meu pai não quer...
-Agora não, que há engarrafamentos...

-Vão sem mim, que eu vou lá ter...

O meu amigo parece a mãe do António Costa.

Acorda, diariamente, convencido de que a sua obrigação é protestar.



2009-10-07

VOTAÇÕES


O LRO leu o post EU VOTO PARTIDO SOCIALISTA e deixou um comentário a que é forçoso responder, desde logo porque, ou muito me engano, é o primeiro comentário a algo que tenha sido escrito neste blog.
Comecemos pelo PS (post scriptum): Diz ele que é uma pena só haver actualizações anuais. Será mesmo uma pena? Quer dizer, será que o que eu escrevo tem algum interesse para alguém? O comentário parece querer dizer que sim, a história do blog parece querer dizer que não, ou muito pouco, ou a muito poucos. Não é que isso me apoquente por aí além mas, às vezes lembro-me de que o mundo ficará mais ou menos na mesma, quer eu escreva ou não e, então, passo a dedicar mais atenção à minha horta, actividade que, entre muitas outras vantagens, faz descer o meu consumo de tabaco cerca de 50%.

Explicação dada, vamos então à política;

Diz o LRO: “Gostaria de saber porque é que cada voto que não vai para o Socrates é um voto na MFL. Isso é uma falácia repetida até à exaustão. Se tal fosse verdade não haveria necessidade de outros partidos e política era só a do poder bipolar e o resto é paisagem. Como os resultados das eleições demonstraram isso não é bem assim.”

Meu Caro LRO,
Por razões que seria demorado explicar, os nossos constituintes optaram por um sistema constitucional semi-pesidencialista quando se poderiam ter decidido ou por um sistema presidencialista, ou por um sistema parlamentarista. A originalidade (quando eu estudei estas coisas havia, ao que parece, sete países no mundo que tinham um sistema semi-presidencialista, incluindo a França que, vista de fora, parece mais presidencialista que outra coisa qualquer) tem tido os resultados que conheces.
Basicamente, foi assim:
O primeiro presidente, não contente com o voto dos portugueses, apadrinhou um partido;
O segundo presidente, não contente com o voto dos portugueses, inventou as presidências abertas;
O terceiro presidente, na ausência de voto dos portugueses, puxou dos galões e acabou com a bernarda em que isto ameaçava transformar-se;
O quarto presidente, não contente com o voto dos portugueses, … não é preciso explicar-te porque ainda tens nos ouvidos aquela inenarrável comunicação.

Como se fosse pouco, os nossos constituintes ainda estabeleceram, para todas as assembleias, um sistema eleitoral, (método de Hondt), com os resultados que também conheces.

A verdade é que, por quase todo o mundo, as eleições servem para escolher as maiorias que hão-de governar.

Em Portugal as eleições parecem servir para tudo menos para escolher quem há-de governar. Fazem-se eleições, nós votamos e todos os derrotados (derrotado é quem não ganha as eleições) continuam a falar como se nada tivesse acontecido, como se ainda não tivesse havido eleições, como se nenhuma importância tivesse tido o nosso voto.

Olha para as eleições do passado dia 27, tal como as vêem os partidos derrotados:
- O PCTP-MRPP ganhou direito a uma subvenção;
- A CDU ganhou eleitores e deputados;
- O BE ganhou votos e deputados;
- O CDS ganhou percentagem e deputados (dois dígitos, gritam eles todos contentes enquanto já falam em partir a espinha ao PSD);
- O PSD ganhou deputados e a Senhora acaba de ser vitoriada em Alcobaça por mil e quinhentos jantantes, e agradeceu com um discurso igualzinho ao que tinha antes das eleições;
- O PS perdeu a maioria absoluta.

Diz-me lá: não é estranho um país onde o único partido que perde é o que tem o maior número de votos?

O que é que tem este arrazoado a ver com a tua pergunta, dirás.
É simples:
Etimologicamente, a palavra Política vem do grego e significa governo da cidade.
Do que eu falava, no meu post, era disso, de Governação.