2008-04-27

route 66 - Notas de Viagem XV


20-6-2007 – De Las Vegas a Los Angeles
Às costumadas oito horas da manhã viramos costas a uma Las Vegas ainda adormecida, sob um sol já quente, pela I15, a caminho da Califórnia. A paisagem é cortada , de quando em quando, por casinos isolados no deserto que a quantidade de carros estacionados mostra que também são bastante frequentados. Fora isso, apenas, à esquerda da auto-estrada, a prisão correccional do Nevada, um enorme quadrilátero de arame farpado tendo no centro uma torre de controlo como as dos aeroportos. A entrada na Califórnia é assinalada pela passagem do Mountain Pass, a primeira vez que nos Estados Unidos vimos uma subida íngreme e longa, como por cá estamos habituados. As mudanças automáticas e o cruise control fazem aqui o seu melhor. O carro começa a roncar furiosamente e salta estrada acima às mesmas 75 milhas /hora programadas, provocando um pequeno susto em quem já se julgava mestre em condução nos States.
Cerca de 150 milhas andadas, sempre em paisagem desética, entre o Mohave e o Death Valley, fazemos um pequeno desvio para visitar Calico,
uma ghost town mineira que depois de décadas de decadência até ao abandono total, foi oferecida pelo proprietário à cidade de Barstow que a está a recuperar como Regional Park.
Almoçámos por dez dólares.
Mal nos sentámos no restaurante, a simpática funcionária, vestida a preceito à moda do Séc. XIX, com uma enorme saia rodada e blusa decotada de folhos, colocou na mesa um balde de esmalte cheio de amendoins cujas cascas se deitam para o chão (no alpendre caminha-se sobre um tapete de cascas de amendoim). Porquê? It's funny! Foi a resposta.
Há um comboiozinho que faz uma pequena volta turística para apreciar as antigas minas, estão recuperadas a prisão, a escola e as oficinas do ferreiro e do arrieiro, o hotel e várias casas onde se vendem os inevitáveis ghifts, postais, tshirts, cestos, velas, especiarias, compotas, vidros e cerâmicas e o objectivo é recuperar a totalidade da cidade. Um velho índio atravessa o terreiro sob o sol escaldante, apoiado numa bengala, um mineiro faz demontrações de garimpagem lavando “ouro” num peneiro e a entrada e o estacionamento ($6,00) são atentamente vigiados por um Xerife a fingir, de colt 45 à cintura. Vale a pena ver.
Vinte e cinco quilómetros mais e estamos de retorno à Route 66, em Barstow, onde não parámos. Aqui teremos, pela última vez, uma vista dos grandes comboios. Mais adiante, espera-nos a última grande paisagem natural do percurso: o Cajon Summit, na travessia das montanhas de São Gabriel. É o contraponto do Mountain Pass, uma descida vertiginosa, num cenário muito bonito e, passadas as montanhas, a Megalópole que conhecemos por Los Angeles.
Alojámo-nos num Super 8 Motel, um bocado manhoso (a par do de St. Louis, o pior de toda a viagem) mas bem situado, entre os Boulevard Hoolywood e Sunset .
Ainda deu para um passeio. Jantámos no Kodak Theatre, servidos por um chinês de Chicago que sabia algumas palavras de português.
O Kodak e o Boulevard Hollywood são bons exemplos da capacidade do cinema de criar ilusão de realidade. É então ali que se realiza a cerimónia dos Oscars? É quase difícil acreditar que aquele cenário possa ser, um dia no ano, o lugar mais glamoroso do planeta.
A propósito, o famosíssimo Walk of Fame é ali mesmo, no passeio. Cuidado! Não faça como eu que, quando reparei, já tinha pisado três das minhas actrizes favoritas.

2008-04-22

Route 66 - Notas de Viagem XIV

19-6-2007 – Las Vegas

Chegados ontem a Las Vegas, alojámo-nos no Sahara, um hotel casino já com alguma idade, (cá ficaram os Beatles, nos anos 60) bem situado no topo da Strip, no cruzamento com a Sahara Avenue, a que deu o nome e com preços muito em conta. Comer e dormir em Las Vegas pode ser, aliás, bem barato (quinze dólares podem ser suficientes para comer bem no Sahara e razoavelmente no Venetian). Ainda houve tempo para uma volta nocturna pela Downtown para ver a sua principal atracção, a Fremont Street em cuja cobertura são, a espaços, projectados espectáculos de luz e som.

Hoje foi dia de correr a via sacra dos grandes casinos. O melhor a fazer – e que fizemos – é comprar bilhetes para o monorail, já que andar na rua com o calor escaldante que se fazia sentir é coisa para arrumar em pouco tempo um turista desprevenido. Dormir a sesta no hotel, nas horas de maior calor é, também, actividade que se recomenda vivamente.
Salvo para aceder a determinados espectáculos ou restaurantes, parece não haver regras no vestir de modo que os casinos estão cheios de gente de calções e de chinelos.
Eu, pessoalmente, não gosto de jogar e nem o facto de já ter estado em muitos casinos, da Póvoa do Varzim a Monte Gordo, passando por quase todos os outros portugueses, pelo Mónaco e por Macau, me fez mudar de ideias. Las Vegas confirmou a minha convicção de que gente com juízo não joga.


Como em todo o lado, nos Estado Unidos, não se fuma dentro dos edifícios. Excepto, claro, nas salas de jogo. Eu, fumador (mais uma razão para não gostar de jogar. Admito que um vício fique bem a um homem. Dois vícios é, certamente, demais), aproveitei a sala de jogo do Sahara para fumar. Vi aí a cena que mais me impressionou em Las Vegas: Depois do almoço, no hotel, vou fumar um cigarro na sala de jogo e vejo um americano típico, enorme, chapéu à Indiana Jones, barba comprida e hirsuta de um grisalho amarelado, matraqueando furiosamente duas slot machines, uma com cada mão. Ainda lá estava, no mesmo estrafego, quando regressei para o último cigarro do dia, antes de ir dormir.
Mas é verdade que Las Vegas é uma doideira espectacular, cada casino maior que o outro, embora, no fundo, todos iguais: entra-se no Hotel e de um lado é o balcão da recepção e do outro abre-se a sala de jogo. A partir daqui acede-se aos restaurantes, às salas de espectáculo, aos quartos e às galerias comerciais, estas também com tendência para se tornarem todas iguais: Ruas com céus fingidos e lojas - todas as lojas, todas as marcas - e restaurantes e cafés com fachadas de cenário que nos tentam convencer de que andamos a passear na cidade-tema do casino (Nova Iorque no New York-New York, Veneza no Venetian, a Roma antiga no Caesar’s Palace). O mais luxuoso de todos, doentiamente luxuoso, é o Bellagio. Um dos mais bem feitos é, concerteza, o Paris. Com uma Torre Eiffel à escala ½, um dos pilares arrancando em plena sala de jogo e um restaurante no topo, como na Torre de verdade, o Arco de Triunfo e a fachada do Louvre e uma ambiência, na galeria comercial, tão bem fingida que não estranharei se amanhã me vierem dizer que alguém se aborreceu na Paris de França, com a desculpa de que já tinha visto aquilo em Vegas.

2008-04-13

Route 66 - Notas de viagem XIII

18-6-2007 - De Flagstaff a Las Vegas

A jornada de hoje havia de nos levar, andados cerca de 450 quilómetros, a Las Vegas, num desvio que um portugesinho, tão longe de casa e sem certezas de alguma vez voltar a estas bandas, não pode deixar de fazer mesmo que para isso tenha de sacrificar uma parte da Route 66 que, ao que leio, também tem muita coisas interessantes para ver.
Logo à saída do motel encontrámos esta curiosa demonstração de como um único motorista pode conduzir três camiões.

A primeira paragem foi em Williams, de onde parte o comboio para o Grand Canyon e chegou a estar no plano de viagem como local de dormida. no entanto, a opção de ficar duas noites em Flagstaff revelou-se, no entanto, bem acertada. Quer pela cidade quer porque esta viagem é fisicamente exigente e são grandes as vantagens de dormir duas noites seguidas na mesma cama e passar um dia sem fazer e desfazer as malas.
Continuamos a mais de dois mil metros de altitude, rodeados por uma enorme floresta (a Kaibab National Forest) de pinheiros (pinus ponderosa), uma das árvores mais comuns dos EUA, onde ocupa uma superfície total maior do que a de Portugal.
Williams que se designa (marca registada) Gateway to the Grand Canyon é, aos nossos olhos apressados, mais uma típica cidade americana de fronteira. Com pouco mais de 3000 habitantes, a sua localização previlegiada relativamente ao Grand Canyon, torna-a um destino turístico relevante, onde vale a pena parar, quanto mais não seja para, como nós, passear na Downtown bem conservada, com muitos edifícios de pedra e de tijolo e cheia de lojas interessantes ou curiosas e aproveitar para, no Williams Visitor Center, ir à internet enviar uns emails e conferir os recebidos.
Retomamos a I40. Os pinheiros começam a rarear até desaparecerem e retornarmos ao deserto. Setenta quilómetros andados, abandonamos a Interstate para entrar no mais longo troço contínuo da Route 66 ainda em uso.
O apogeu do american kitsch que, com frequência, rodeia a Route 66, é este estabelecimento de ar decrépito, em Selligman, onde se vendem bebidas frescas e toda a memorabilia da Route e se amontoam os símbolos dos felizes anos 50 numa amálgama que não chega a ser de mau gosto mas aparece aos nossos olhos como evidência da inocência que tantas vezes associamos aos americanos. É, efectivamente, de inocência que se trata. Por absurdo que vos pareça, o que me veio à cabeça perante tal visão foram aquelas hortas que todos conhecemos da beira dos auto-estradas nos arredores de Lisboa, onde reformados saudosos da origem rural plantam afincadamente hortaliças, despreocupados da óbvia poluição do local, enquanto, assustados com os potenciais prejuízos que a passarada, os cães e os passantes sejam capazes de provocar, rodeiam os canteiros de toscas sebes de madeira e chapa, enchem os cantos de bidões coloridos para garantir a rega e constroem espanta-pardais pendurando latas, garrafas de plástico e panos velhos, em paus e canas.

Mas hoje não vamos ver hortaliças. Apenas morros pedregosos onde, a espaços, se vislumbram ruínas de cidades fantasmas, restos de pequenos aglomerados que o tempo e o deserto engoliram ao ritmo do esgotamento das minas de prata que justificavam a sua existência. É o caso de Hackberry, oficialmente uma Ghost Town de que sobra o Hackberry General Store, com uma curiosa colecção de bombas de gasolina, máquinas de gelo e de coca-cola, fotografias de Marilyn Monroe e de Elvis Presley, anúncios e logos antigos incluindo um grande cavalo alado da Mobil, automóveis e pequenas camionetas dos anos quarenta e cinquenta. Um dos mais conhecidos ícones da Route 66 que é, também, um interessante museu no deserto com essa vantagem imensa, neste dia escaldante, de ter sombra e bebidas frescas.
Em Kingman alomoçamos, vimos os comboios da BNSF e viramos para Norte, pela US 93, sempre por paisagens áridas,


até à Hoover Dam.
Construída no tempo record de quatro anos, entre 1931 e 1935, a Hoover Dam é, ainda hoje, uma das maiores barragens do mundo, fornecendo energia eléctrica ao norte do Arizona, Las Vegas e grande parte do Nevada e Califórnia. Há visitas guiadas ao interior que não deixamos de fazer (não percebo porque é que a EDP não tem um programa consistentes de visitas a barragens). Estava um calor insuportável, mas isso não impedia centenas de turistas (um deles rigorosamente vestido de cowboy, incluindo cinturão de onde pendia um pequeno coldre que era a bolsa do telemóvel) de admirar uma das grandes obras de engenharia dos EU.


Entramos no Nevada, passando ao lado de Boulder City, a cidade construída para alojar os trabalhadores que fizeram a barragem e, pouco depois, começa a surgir do deserto, como gigantesca miragem, o absurdo de Las Vegas.

2008-04-04

Route 66 - Notas de viagem XII

17-6-2007 - Grand Canyon

O dia de hoje estava reservado para a visita ao Grand Canyon.
Traçámos um percurso um percurso de cerca de 350 quilómetros com passagem pelo Sunset Crater National Monument.

E pelo Wupatki National Monument, ruínas de uma aldeia de pedra, testemunho de uma civilização desaparecida. (como bónus, sempre que as vistas se abriam à nossa direita, a paisagem fabulosa do Painted Desert).

Não estava na lista (nem sabia que existia) mas soube bem. Antes do Grand Canyon, uma paragem no Litle Colorado River Gorge, Navajo Tribal Park.

O Grand Canyon, esse, não tenho talentos literários para vos contar como é. Se puderem, vão ver com os vossos próprios olhos.


Se lá puderem ir e pedirem para lhes tirarem uma fotografia vão, certamente, ficar com um ar tão feliz como nós ficámos.


O regresso a Flagstaff foi feito por Oeste, pela US 180, através da Cococino National Forest, ladeando o Humphrey's Peak que, com os seus 3850 metros é a montanha mais alta da região ao abrigo da qual se desenvolvem as estãncias de inverno do Flagstaff Nordic Center.