2007-12-26

Oklahoma City

Oklahoma City não ía referenciada como um dos “momentos” da viagem, pelo que o tempo programado tinha em mira mais o descanso que a cidade mas transformou-se num dia e meio cheio de curiosidades. Chegámos depois do almoço em Vinita, no former world’s largest McDonalds, um enorme arco dourado em ponte sobre a Interstate 44.
O Cattlemen’s Café está em Stockyards City há quase cem anos, a servir negociantes de gado, rancheiros e cowboys. Eis um bife que vale a pena, grande e alto, como por cá se não fazem, tenro, saboroso e fresco, acompanhado de salada e de uma deliciosa baked potato. Para a digestão passeia-se em volta, nas lojas especializadas em western wear and farm and ranch needs de onde se pode sair um cowboy de fazer esquecer o John Wayne.
Bricktown é um mega projecto de revitalização da downtown de OKC, umas docas inventadas pelo mayor, a troco de umas centenas de milhões de dólares, desenvolvendo-se em redor de um bonito canal onde se passeia de water taxi e onde ao fim da tarde os mosquitos não perdoam. À custa da comichão que a Lena teve de suportar nessa noite, no dia seguinte e por mais uma noite, descobrimos em Tucumcari (NM) uma realidade americana: Há aqui uma farmácia de serviço?, perguntámos ao jantar. Bem, vocês vão para Este ou para Oeste? É que para Este a farmácia de serviço mais próxima é a cerca de 100 milhas, para Oeste, a 160 milhas. Aqui há uma mas abre amanhã às 8H30. De facto abriu e a pomada fornecida resultou em pleno.
De volta à Bricktown: Toby Keith's I Love This Bar and Grille. América em estado puro. Um balcão onde dezenas de bebedores de cerveja conversam ao fim da tarde, mesas espaçosas e bem aparelhadas (sem toalha. Os americanos não usam toalhas), comida de muito bom aspecto e, ao que me dizem, de sabor condizente. Eu que nestas coisas sou muito conservador, optei por mais um bife. Quase tão bom como o do Cattlemen's. Há espaço para dançar frente ao palco onde as bandas convidadas tocam country music, que o Toby Keith é uma estrela e àquela hora actuava em Las Vegas. Nas paredes, guitarras decoradas com a stars and strips, harley’s, frentes de cadillac’s antigos e um écran que projecta imagens do patrão. Compro um CD? Confesso os limites da minha tolerância ideológica. O vídeo e as letras não deixam dúvidas. O homem (chapéu de cowboy, calça de ganga e tshirt muito justa sobre a qual brilha uma enorme cruz a realçar a musculatura) tem uma ementa especial para soldados e apoia todas as acções militares americanas no estrangeiro, porque sim. Não lhe fará diferença mas vai ter que vender o CD a outro.
O hall de entrada do National Cowboy and Western Heritage Museum é dominado pela famous 18-feet escultura The end of trail, de James Earle Fraser, representação ambígua da derrota das nações índias e passa-se a uma galeria onde se vende a arte do imaginário cowboy: esculturas de pôr nos móveis ou nos cantos da sala, sempre no mesmo registo minucioso e naturalista e pinturas tal qual que em Portugal já só se vêem em lojas de decoração vocacionadas para ricos recentes. E essa coisa assombrosa que é o cinema como fonte primária da história. Will Rogers, aliás, não deixará de nos acompanhar desde que o encontrámos pela primeira vez, no Mcdonalds de Vinita, até Santa Mónica e San Francisco.
Mas no Art Institute de Chicago a abarrotar de gente vi esse espanto que é o American Gothic – Grant Wood, 1930 -, acolitado por Picasso, Kandinsky, Magrite, Matisse, Warhol, O’Keefe, Pollack e Nauman e, no Getty de LA, vi Defining Modernity: European Drawings, 1800-1900.
O MoCa não me convenceu e o Gehry do Disney e do Millenium Park, continua sem me convencer. A arquitectura há-de ser mais que um revestimento ondulado de escamas de aço polido. O MoMa tem o Starry Night e o Rapaz com Cavalo e Les demoiselles d’Avignon e, naquelas horas de entradas gratuitas, tanta gente por metro quadrado como o nosso Metro em hora de ponta e, ao lado, a pista de gelo que já vimos nos filmes era uma esplanada bem apropriada ao calor de New York. Como é que tudo parece tão grande visto no écran? Como é que o Kodak Theater tem tanto glamour em noite de óscares se o Blvd Hollywood parece a Almirante Reis? Ah!, e o passeio da fama! Quando damos por ele já pisamos, pelo menos, três das nossas actrizes favoritas.
E já que aqui estamos voltemos aos bifes que também são óptimos no Sladder Saloon em Sunset Plaza, cheio de jovens adultos barulhentos que festejam um aniversário bebendo cerveja numa roda ao balcão, de onde às vezes um sai para testar equilíbrios no touro mecânico.
De sem-abrigos em Hollywood, da imensidão do Novo México e do Arizona, do Grand Canyon, de cidadezinhas de madeira, de camiões e comboios, do parque infantil para adultos conhecido por Las Vegas, de hamburgers, cheeseburgers e cheesecakes, de fat boys, de Times Square e Rodeo Dr, da simpatia e curiosidade dos americanos e do mais que a lembrança o permitir, falaremos noutra altura.

(Texto também disponível em http://sputnik-webzine.blogspot.com/, incluindo uma english version)