2009-11-10

Nostalgias

Um amigo meu, agora num atempado e merecido gozo da reforma, ocupa uma boa parte do seu tempo na internet enviando à sua mailing list um grande conjunto de emails de diverso tipo: fotografias de maravilhas da natureza, fotografias de tempos antigos, artigos de opinião (estes, todos, contra o governo que o meu amigo julga a encarnação do mal e da estupidez).



Um dia destes mandou-me uma colecção de velhas fotografias dos velhos barcos que, antes de 1974, asseguravam o transporte de pessoas e mercadorias entre Portugal e as Colónias. O assunto do email era: “Não é saudosismo, é nostalgia…”

Porque o “assunto” me irritou, respondi-lhe com a definição de nostalgia que os dicionários dizem vir do francês e ser uma tristeza profunda causada por saudades do afastamento da pátria ou da terra natal, um estado melancólico causado pela falta de algo.

E acrescentei que, não vendo que lhe faltasse algo que pudesse ser compensado pela visão de alguns velhos barcos, teria então de concluir que tal melancolia era provocada por saudades de uma "Pátria" que já não existe.

Mais acrescentei que, andando o meu amigo sempre a recomendar leituras, havia de permitir que lhe recomendasse os "Textos escolhidos, Vol. I: Portugal, o Ultramar e o futuro" de Manuel José Homem de Mello, recentemente reeditado e apresentado no passado dia 5 na Fundação Mário Soares (começa a ser tempo de os portugueses arrumarem esta questão e perceberem que as independências das colónias só pecaram, no que a Portugal diz respeito, por tardias).

É claro que o meu amigo não gostou e, claramente enxofrado, como se diz na minha terra, respondeu puxando dos seus galões anti-salazaristas de degredado para os Açores ao tempo da sua vida militar por ter sido considerado "Um oficial com ideias políticas" e recusou a responsabilidade do “assunto” já que havia reenviado o email tal como o tinha recebido e, apenas, por considerar que as imagens dos navios do velho Portugal colonial, além de serem um documento histórico, dizem muito àqueles que fizeram o seu serviço militar nas antigas colónias portuguesas.

Tudo isto é, por certo, muito verdade. Mas eu, que nem tenho especiais credenciais anti-salazaristas para exibir que gosto de história e sempre reveria com interesse um documento sobre a frota colonial portuguesa, posso também queixar-me de o “Alfredo da Silva”, que me levou para a Guiné, não fazer parte da galeria.


Mas não é disso que me queixo.


O meu amigo não viu ou não quis ver que o que está em causa é, apenas e só, o título do assunto que é, ele, todo um programa ideológico.


Parafraseando o que diz o Garrett, nas Viagens Na Minha Terra: Há emails que não deviam ter título e há títulos que não deviam ter email.

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